100 anos de militância a caminho do futuro

1921-2021

quinta-feira, 30 de abril de 2020

Joaquim Pires Jorge - com uma imensa alegria














As histórias da História de Joaquim Pires Jorge são histórias da História da classe operária portuguesa e do seu Partido. Valem pela experiência e pelas lições que encerram e é esse o objectivo deste livro. 
Joaquim Pires Jorge morreu poucos meses depois  de acabar de contar a história que termina - é bem próprio dele - com a palavra alegria. Joaquim Pires Jorge morreu, mas deixou a lição da sua vida exemplar. É isto também, como dizia Pablo Neruda, o Partido: "Fizeste-me ver a claridade do mundo, e como é possível a alegria. Fizeste-me indestrutível pois contigo não termino em mim mim próprio."


da nota introdutória ao livro,
da autoria do jornalista
que organizou o livro 
- João Paulo Guerra -,
editado em Agosto de 1984


quarta-feira, 29 de abril de 2020

Até Amanhã, Camaradas



– Até Amanhã, Camaradas – Joaquim Leitão (2005)

Filme que adapta a obra homónima de Manuel Tiago, pseudónimo de Álvaro Cunhal. Num país oprimido por uma ditadura retrógrada, servida por uma polícia política implacável (PIDE), há quem resista e se organize para mobilizar o povo na luta pelo pão e pela liberdade, mesmo que isso lhe possa custar a prisão, torturas, ou até a vida. Pessoas como Vaz, Ramos, António e Paula, militantes e funcionários do Partido Comunista, que desenvolvem a sua ação na clandestinidade, reorganizando o Partido nas zonas dos arredores de Lisboa e do Ribatejo, ao mesmo tempo que preparam uma grande jornada de luta, com greves e marchas contra a fome.

3. O CENTRALISMO DEMOCRÁTICO, PRINCÍPIO BÁSICO DE ORGANIZAÇÃO DO PCP

Página 7



             O centralismo significa, em quinto lugar, que depois da discussão em cada organismo, as resoluções tomadas são obrigatórias para todos os seus membros (artº 15).
             Como vimos, qualquer militante do Partido pode apreciar a sua orientação e atividade, pode (e deve) participar nas resoluções do seu organismo, pode (e deve) exercer a crítica e a autocrítica, pode (e deve), por via da organização, participar na elaboração da sua linha política. São admitidas divergências de opinião, que são vantajosas quando se manifestam dentro das organizações do Partido.

             Mas a liberdade de discussão, tal como o direito de crítica, existem não por si mesmos, mas com a finalidade de adotar resoluções concretas sobre determinados problemas. O Partido não é um “clube de discussões”: é sim uma organização para a ação, para a luta. Por isso mesmo, uma vez debatidos os problemas e tomadas em consideração as opiniões críticas, o Partido deve formar um critério único acerca deles. Se não for possível a unanimidade de pontos de vista, há que votar. A discussão cessa quando aprovada uma resolução sobre a questão em debate. A minoria submete-se, então, à maioria, tornando-se a resolução obrigatória para todos.

             O centralismo significa ainda, em sexto e último lugar, uma disciplina rigorosa no acatamento dos princípios orgânicos e das disposições estatutárias do Partido (artº 11,e).

             A disciplina do Partido obriga todos os seus membros, sem exceção. Não é uma disciplina ditada pelos que estão “acima” e cumprida pelos que estão “abaixo”. Não há uma disciplina para os “grandes senhores” e outra para a “arraia-miúda”, tal como não há uma disciplina para os “militantes velhos” e outra para os “militantes novos”. A disciplina é “igual para todos os membros do Partido” (artº 34), obriga tanto o mais apagado militante como o mais destacado dirigente. Entretanto no que respeita à disciplina, como no que respeita a todos os deveres do militante do Partido, a gravidade da falta é tanto maior quanto mais responsabilidade na organização tem o militante (artº 36).

             A disciplina do Partido não é cega, é sim uma disciplina consciente. Baseia-se na aceitação esclarecida da orientação, do Programa e dos Estatutos do Partido. Os militantes aceitam-na porque compreendem que ela é necessária para que o Partido possa cumprir as suas tarefas, porque sabem que ela não contradiz antes é condição da democracia interna.

             A disciplina de Partido também não é de “caserna” é sim uma disciplina voluntariamente aceite. Ao aderir livre e conscientemente ao Partido, cada comunista aceita a sua lei, contrai voluntariamente os deveres definidos nos Estatutos, entre eles o de ser “cumpridor escrupuloso da disciplina do Partido” (artº 9, g).



domingo, 26 de abril de 2020

Soeiro Pereira Gomes escritor e revolucionário

Para melhor conhecermos o Partido

 
Soeiro Pereira Gomes

Uma Biografia Literária
Giovanni Ricciardi


Escrevendo directamente em português, numa prosa limpa e comunicativa, Giovanni Ricciardi, de há muito ligado a profundos estudos sobre o nosso neo-realismo literário, levou a efeito amorosamente esta biografia, que é fruto sazonado de uma honesta e aplicada investigação, tendo ao mesmo tempo a vivacidade, o colorido, o empenhamento afectivo do romance de uma vida.
Soeiro Pereira Gomes, que sobretudo pelos Esteiros, e até por alguns dos Contos Vermelhos, vai provavelmente ficar na história da literatura portuguesa como um dos principais autores da primeira metade do século XX, com a simplicidade de certos grandes mestres que o caracteriza, merecia bem ter encontrado este biógrafo.


Do prefácio de Urbano Tavares Rodrigues


O outro confinamento


Opinião
Confinamento social, confinamento político: realidades a não confundir

No próximo dia 25 de Abril vou quebrar o confinamento social em que me encontro desde 18 de Março para estar presente na Assembleia da República por uma questão de dever, por respeito pela memória de tantas vidas sacrificadas, mas também porque é preciso dizer aos saudosistas do passado que não passarão.

Público 25 de Abril de 2020
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O “confinamento social” repentina e inesperadamente passou a marcar o modo do viver quotidiano de grande número de portugueses e consequentemente motivo de notícias, de debates, de diversas análises. O “confinamento social”, ainda que a palavra social definidora da natureza do confinamento seja não poucas vezes suprimida, ocupa tal dimensão que parece ter-se tornado o grande problema do país e o maior dos dramas dos cidadãos.
Não se subestimam as perturbações que a situação provoca a vários níveis na vida, em particular nos idosos há muito confinados pela vida difícil e as políticas de estigmatização da própria velhice. De qualquer modo, convirá não esquecer que não há confinamento em geral, que os seus efeitos são diferenciados conforme a origem social que determina a qualidade das habitações e até a sua ausência, os equipamentos de lazer e de acesso à informação, isto é, a sua ligação à vida e ao mundo.
Para os que nasceram depois do 25 de Abril, para quem a liberdade é tão natural como respirar, a situação de confinamento social é uma grilheta dolorosa, mas qualquer semelhança com o confinamento e isolamento a que foram sujeitos dezenas de milhares de antifascistas presos é um absurdo, quer no plano do quotidiano quer no plano humano, desde logo porque os objectivos policiais eram abalar as convicções dos presos, a sua destruição.
Uso as palavras confinamento e isolamento porque, embora inseparáveis, as suas consequências eram diversas. As prisões eram espaços confinados mas eram-no muito mais o espaço, por vezes minúsculo, em que viviam os presos, além da quase ausência de equipamentos, da privação de acesso à informação e da permanente devassa da vida pessoal e até afectiva.
Dos cerca de onze anos passados nas cadeias do Aljube, Caxias e Peniche, nove desses anos passei-os em Peniche em regime celular de isolamento de mais de vinte horas diárias, num espaço de dois por três metros com uma janelas de vidros foscos, onde obviamente não havia televisão nem telemóvel e não poucas vezes se era privado de livros e jornais, e em que as refeições, momento de encontro dos presos do mesmo piso, decorriam em rigoroso silêncio, e o viver do dia-a-dia, segundo as normas, era a sua sujeição a vigilância constante. A isto, os carcereiros chamavam de regime normal que se se seguia ao período de interrogatórios e isolamento total, forma de tortura complementar das torturas físicas, uma forma de tortura, para muitos presos, a mais brutal e destruidora forma de tortura pelos efeitos no estado psíquico.
Cada preso teve a sua experiência própria e enfrentou essa realidade de modo diferenciado. Os períodos de isolamento total, no meu caso, resumem-se a cinco meses nos “curros” do Aljube, um mês numa cela de Caxias e outro mês numa cela de Peniche, e dez dias no segredo de Caxias. Nenhuma das experiências foi igual. Falar dos meses nos “curros” do Aljube é falar de se estar num buraco de cerca de um metro por dois, sem mobilidade, na obscuridade, sem meios de escrita ou de leitura, sem relógio, sem visitas ou conhecimento do que passa no exterior e de perda da própria noção do escoar do tempo. Não era pouco perturbante o estar-se à espera de se ir para os interrogatórios ou regressar num estado lastimoso para sarar feridas em condições de isolamento.
Quando refiro as três experiências diferentes é porque não havia isolamento em geral. É que estar isolado sem escrita, sem livros, sem visitas, em celas com luz, sobretudo quando se passava pelo segredo de Caxias, as celas transformavam-se quase num paraíso. O segredo era um buraco subterrâneo, sem qualquer réstia de luz, com um minúsculo respirador, sem cama, onde não chegavam sons e as movimentações se faziam às apalpadelas. A sensação era de que se tinha sido enterrado vivo. E no entanto, porque era proibido cantar, era preciso desafiar a prepotência dos carcereiros cantando.
No peso do isolamento não era indiferente a idade e a vida familiar, sobretudo quando se era preso com a companheira e nada se sabia do que se está a passar com o outro. No meu caso, a minha companheira só soube que também estava preso dois meses e meio depois. Vencer o isolamento exigia uma grande mobilização de energias, recriar mentalmente a vida exterior, pensar que lá fora a luta continuava e era preciso mostrar que a firmeza das convicções era superior à violência policial.
O isolamento, as torturas não eram só sofrimento. Eram uma luta para vencer a polícia, uma afirmação de dignidade, de confiança nos ideais. A derrota da polícia igualmente uma fonte de alegria e de bem-estar espiritual.
O 25 de Abril pôs fim a estes tempos negros. No próximo dia 25 de Abril vou quebrar o confinamento social em que me encontro desde 18 de Março para estar presente na Assembleia da República por uma questão de dever, por respeito pela memória de tantas vidas sacrificadas, mas também porque é preciso dizer aos saudosistas do passado que não passarão.