JOAQUIM NAMORADO (1914 – 1986)
Joaquim Victorino Namorado nasceu em Alter do Chão, a 30 de Junho de 1914 e
faleceu em Coimbra, a 29 de Dezembro de 1986. Antifascista militante que marcou
sucessivas gerações, sobretudo de universitários que passaram por Coimbra, era
um homem de rara craveira intelectual, de grande cultura e de invulgar
preparação ideológica. A tenacidade com que enfrentou a Ditadura, a coerência
nos princípios, a disponibilidade e a vivacidade com que dialogava com os
jovens, criaram-lhe uma aura que ficou na memória daqueles com quem privou.
Cidadão da Resistência contra a Ditadura, poeta percursor do neo-realismo, foi militante
do Partido Comunista Português desde a década de 30.
1. Frequentou o liceu em Portalegre e depois inscreveu-se na Faculdade de
Ciências da Universidade de Coimbra, onde fez os estudos preparatórios para a
Escola Naval e, em seguida, o curso de Ciências Matemáticas, que iria completar
em 1943, depois de várias interrupções.
Em 1935 foi eleito para a direcção do Centro Republicano Académico. Afastou-se
da Esquerda Republicana e ligou-se ao Partido Comunista Português. Esteve
várias vezes preso por motivos políticos (a primeira em 1938, acusado de
distribuir panfletos do Bloco Académico Anti-Fascista, acusação pela qual foi
julgado no Tribunal Militar Especial do Porto e absolvido por falta de provas).
Em 1943 foi um dos organizadores em Coimbra do MUNAF. No ano seguinte
encontrava-se entre os membros dos Grupos Anti-Fascistas de Combate (GAC),
aderiu ao MUD e, em 1948, fez parte da comissão concelhia de Coimbra de apoio à
candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República.
Entre 1944 e 1948, leccionou em colégios de Coimbra, mas o diploma de professor
do ensino particular foi-lhe retirado e ficou impedido de desempenhar funções
públicas (situação que só se alterou depois do 25 de Abril). Entre 1950 e 1959,
esteve na clandestinidade (em fuga à PIDE, durante um certo período)e, em 1962,
voltou a ser preso pela polícia política, acusado de pertencer ao Partido
Comunista e às Juntas Patrióticas, tendo ficado em prisão no Forte de Caxias.
Nas eleições legislativas de 1969 foi candidato na lista da CDE de Portalegre.
Matemático de formação, após o 25 de Abril foi convidado pela FCUC e ingressou
no quadro de professores da secção de Matemática da Faculdade de Ciências e
Tecnologia da universidade de Coimbra.
2. Como poeta foi uma figura nuclear do movimento neo-realista do qual foi
percursor e teórico. Em 1936 começou a colaborar na revista Manifesto, dirigida
por Miguel Torga, e, no ano seguinte, foi um dos fundadores dos Cadernos de
Juventude, cujo primeiro número a PVDE apreendeu na tipografia. Em 1939, ganhou
o prémio de ensaio dos Jogos Florais Universitários, com Breve Introdução à
Leitura dos Poetas Modernistas, e, em 1940, foi de novo premiado, juntamente
com João José Cochofel e Álvaro Feijó. Em 1945 foi um dos reformadores da revista
Vértice, e seria seu director entre 1975 e 1981.
Além dos Cadernos da Juventude e da revista Vértice, colaborou nas revistas
Altitude e Seara Nova, bem como nos jornais O Diabo e Sol Nascente. Editou na
colectânea de poesia Novo Cancioneiro a sua primeira obra poética, Aviso à
Navegação. Toda a acção de Joaquim Namorado, poética, ensaística, doutrinária
ou cultural, se desenvolveu a partir do reconhecimento do papel do intelectual
na divulgação da cultura enquanto instrumento de consciencialização do povo,
dotando-o de apetrechos para se elevar e, consequentemente, se libertar
politicamente; e de que o processo artístico que serviria melhor este processo
de transformação ideológica encontrava numa arte realista e de intenção social
a forma mais apropriada para uma comunicabilidade imediata. A sua criação
poética, atenta à natureza e ao Homem, concebida como expressão natural e
sincera de uma existência que não é necessário explicar, era para Joaquim
Namorado assumida como necessária, pelo vasto processo de renovação que
integra, mas, sobretudo, por aí ressoarem vozes e verdades imanentes: a voz do
mundo "ressoando no meu ouvido/ como num búzio um mar perdido" (cit.
por PITA, A. P. in Vértice, II, 12.91).
«Na lembrança da força renovadora que foi trazida à literatura portuguesa dos
anos 40 pelo movimento neo-realista, o nome de Joaquim Namorado aparece na
primeira linha, não por ter sido apenas um dos seus mais acérrimos e coerentes
defensores, mas sobretudo pelo exemplo da sua intervenção poética e cultural
nos difíceis anos do fascismo salazarista. Relendo na distância dos anos os
seus poemas ou alguns dos breves ensaios e críticas sempre em redor de poetas e
da poesia, (…) o autor de Poesia Necessária retoma ainda connosco esse mesmo
diálogo ou renova, pelo clamor do tempo, os mesmos pressupostos ideológicos e
estéticos que justificaram e clarificaram a sua “poética da cultura”» (1)
Em Janeiro de 1978, assinou um manifesto dirigido Ao Povo Português,
protestando contra o governo de coligação entre o Partido Socialista e o Centro
Democrático Social, prestes a constituir-se. Em 1982 foi eleito para a
Assembleia Municipal da Figueira da Foz. Empenhou-se na actividade da
Associação de Amizade Portugal-RDA.
3. Em 1983, a Assembleia Municipal e o executivo da Câmara Municipal de Coimbra
atribuíram-lhe a Medalha de Ouro da cidade.
Em Janeiro de 1983, por iniciativa do jornal Barca Nova, a Figueira da Foz
prestou-lhe uma significativa Homenagem, que constituiu um acontecimento
nacional de relevante envergadura, onde participaram vultos eminentes da
cultura e da democracia portuguesa. Na sequência dessa homenagem, a Câmara
Municipal da Figueira, durante anos, teve um prémio literário, que alcançou
grande prestígio a nível nacional: “Prémio do Conto Joaquim Namorado".
Por ocasião do centenário do seu nascimento (desde Junho de 2014 até Junho de
2015), Joaquim Namorado foi homenageado em Coimbra pelo PCP, em conjunto com
algumas entidades da cidade. A sua poesia foi lembrada, com vivacidade, nos
locais que ele mais frequentava (Café Tropical, Praça da República,
Departamento de Matemática, Ateneu de Coimbra, Casa da Escrita e café A
Brasileira). Foi distribuída uma pequena biografia do artista e o poema “É
preciso que saibas!”(2). Na Casa Municipal da Cultura foi apresentado o livro
“O herói no neo-realismo mágico” (da autoria de Jaime Ferreira, amigo de
Namorado e que integrou a redacção da revista Vértice em 1972, a convite deste)
– uma obra editada na Lápis de Memórias, com textos intimistas que recordam
Coimbra de outra época, uma cidade intelectualmente viva. Durante as
comemorações, a Lápis de Memórias lançou uma fotobiografia de Joaquim Namorado.
Saiu um número especial da revista Vértice e foi levada a Coimbra uma exposição
bibliográfica sobre o escritor, que esteve presente no Museu do Neo-realismo,
em Vila Franca de Xira. A Escola da Noite, o Ateneu de Coimbra, Casa da
Escrita, Casa da Esquina, O Teatrão, Sindicato dos Professores da Região
Centro, Câmara de Coimbra e Universidade de Coimbra foram outras entidades
envolvidas nesta homenagem ao cidadão poeta e professor.
Notas:
(1) Serafim Ferreira - Prémio do conto Joaquim Namorado, Município da Figueira
da Foz / 1997. Escritor e Crítico Literário, Lisboa. Colaborador do Jornal A
Página da Educação.
(2) «É preciso que saibas»
Se espetas
Certeiro
Ao coração do Povo
É a ti que feres.
Se cercas
De grades
A vida do Povo
É a ti que prendes.
Se julgas
Sem justiça
O direito do Povo
É a ti que condenas.
Se negas
A verdade
À palavra do Povo
É a ti que mentes.
Se lavras
No duro chão dos dias
O tempo futuro
É nele que vives.
(Joaquim Namorado)
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