100 anos de militância a caminho do futuro

1921-2021

quarta-feira, 29 de julho de 2020

LOBÃO VITAL (1911 – 1978)



LOBÃO VITAL (1911 – 1978)

Arquitecto antifascista foi uma figurante marcante da Resistência. O seu nome, (indissociável do nome da engenheira Virgínia Moura), está entre aqueles que, durante décadas, se destacaram pela luta tenaz que travaram contra o regime. Esteve nos combates do MUNAF, do MUD e do Movimento Nacional Democrático; nas batalhas políticas em torno das candidaturas presidenciais de Norton de Matos (1949), de Ruy Luís Gomes (1951), de Humberto Delgado (1958); nos congressos da Oposição de Aveiro e nas campanhas políticas desenvolvidas em torno das farsas eleitorias para a “Assembleia Nacional”, especialmente em 1969 e 1973. Esteve, também, em todas as acções de solidariedade com os presos políticos e contra a repressão. Encabeçou numerosas manifestações e lutas pela Paz, pela melhoria das condições de vida e pela libertação dos povos colonizados. Preso, por diversas vezes, nunca cedeu à violência da polícia política.

1.   António Lobão Vital nasceu em Aguiar da Beira, em 1 de Setembro de 1911, filho de José Vital de Matos e de Maria da Natividade Lobão Ferreira Vital. Faleceu no Porto a 13 de Junho de 1978.
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Era muito jovem quando começou a tomar posição contra a Ditadura. Foi expulso dos estabelecimentos escolares, por ter fundado a revista Outro Ritmo, sendo obrigado a fazer o liceu como aluno externo. A perseguição política de que foi alvo iria agudizar-se em 1930, quando participou nas lutas académicas e nas greves estudantis; e, preso pela primeira vez em 1935 por “fazer propaganda comunista”, foi depois detido inúmeras vezes.

Formou-se em Arquitectura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto e, ainda estudante, casou com Virgínia Moura, também ela uma figura carismática de lutadora contra o fascismo (1).

2. Em 1943 Lobão Vital integra a direcção do MUNAF; em 1944, a Comissão Central do MUD; e, em 1949, a direcção do MND – Movimento Nacional Democrático, que substituiu os ilegalizados MUD e MUNAF (2).

Militante do Partido Comunista Português, Lobão Vital sofreu anos de cadeia. A sua primeira prisão aconteceu em 3 de Fevereiro de 1935, sob a acusação de fazer propaganda comunista [acusação que bastava para lhe serem aplicados os maus tratos, habitualmente infligidos aos presos políticos mais combativos], foi levado para o Aljube do Porto e condenado no Tribunal Militar Especial. A pretexto de averiguações e de acusações do que o regime fascista do Estado Novo chamava “crimes contra a segurança do Estado”, iria sofrer outras prisões, nomeadamente em 4 de Outubro de 1951, em 21 de Fevereiro de 1952, em 26 de Dezembro de 1953, em 26 de Agosto de 1954. Foi julgado pelos Tribunais Criminais do Porto e Tribunal Plenário do Porto: em 1951, em 1952, em 1955, em 1957 e em 1962. Foi defendido pelos advogados Luiz Francisco Rebelo e Lino Lima. Durante anos esteve preso, ora na Delegação da PIDE do Porto, ora na Cadeia Central do Norte, ora no Aljube (enfermaria) ou sede da Pide em Lisboa, e passou cerca de um ano em Peniche.

3. Fez parte da primeira direcção da Revista Sol Nascente, publicada em 30 de Janeiro de 1937 (Revista criada em sua casa).

Foi um dos arquitectos fundadores da Organização dos Arquitectos Modernos (ODAM), que existiu no Porto, de 1947 a 1952 (3).

Participou activamente nos três Congressos da Oposição, realizados em Aveiro, tendo sido sempre figura cimeira e um dos seus impulsionadores. Integrou a Comissão Nacional do II Congresso Republicano (1969) e do III Congresso da Oposição Democrática (1973); e, neste último, foi (com Virgínia de Moura) autor da tese: «As casas dos trabalhadores nos centros urbanos».

Com a coragem que, nesses anos, era necessária para enfrentar a polícia em tais circunstâncias, Lobão Vital integrava, frequentemente, mesas de comícios eleitorais, de sessões comemorativas e de outras iniciativas de resistência ao regime fascista , nomeadamente nos comícios: da Campanha Eleitoral da CDP, no Cine-Teatro de Rio Tinto (1969); da Campanha Eleitoral da Oposição Democrática, em Matosinhos, Teartro Contantino Nery (1973); e na sessão/comício comemorativo do 31 de Janeiro, no Coliseu do Porto (1974).

[Em 1951, no final de uma sessão realizada no Cine Victória em Rio Tinto, foi violentamente agredido pela PSP (juntamente com Virgínia de Moura e José Morgado) e teve de ser socorrido nos serviços de urgência do Hospital Geral de Santo António].
Colaborou em diversos jornais antifascistas.

Em 1974, Lobão Vital publicou na Editora Inova «Alguns Aspectos do Problema Habitacional» na Editora Inova.
O arquitecto Lobão Vital elaborava projectos de arquitectura que eram depois, muitas vezes, apresentados com a assinatura de outros profissionais, para assim escaparem à reprovação dos agentes que o governo fascista colocava à frente das Câmaras Municipais.
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4. Data de 1976 o último manifesto que Lobão Vital assinou [já gravemente doente], juntamente com o Professor Ruy Luís Gomes, com a Engenheira Virgínia Moura e com o Matemático José Morgado – um manifesto contra os avanços dos partidos da direita (4).

António Lobão Vital e Virgínia Moura, grandes obreiros de algumas lutas pela liberdade, assumindo corajosamente o confronto com o regime opressor de Salazar, foram, inquestionavelmente, dois dos mais destacados rostos legais do PCP, partido então na clandestinidade. Até ao 25 de Abril, constituíram uma referência, política e moral, para gerações de jovens, de trabalhadores e intelectuais.

Os túmulos de Lobão Vital e Virgínia de Moura estão no cemitério do Prado do Repouso, no Porto, junto ao edifício onde durante anos funcionou a PIDE/DGS. Em Abril de 1994, os seus restos mortais foram transladados de um jazigo de família amiga para um jazigo próprio, uma obra do Arquitecto Alcino Soutinho e do Escultor José Rodrigues. Na ocasião, foi-lhe prestada uma homenagem, que contou com a intervenção de José Morgado salientando na sua vida de luta antifascista, a coragem e a firmeza com que enfrentou o regime (5).

Foi publicada, em 2015, uma edição da Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto, "Tem cuidado, meu amor", coordenada por Manuela Espírito Santo. O livro que inclui cartas escritas na prisão entre 1951 e 1957 e doadas por Virgínia de Moura ao jornalista e escritor César Príncipe, constitui apenas uma pequena parte de um mais vasto espólio do casal (6).

O seu nome faz parte da Toponímia de: Moita (Freguesia do Vale da Amoreira); e do Porto.
Notas:
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(1) Virgínia de Moura [1915 - 1998] nascida em S. Martinho do Conde (Guimarães), era filha de uma professora primária que, pelo facto de ter sido mãe sem ser casada, enfrentara um estigma que condicionou a vida de Virgínia e terá ajudado a forjar o seu carácter precocemente revolucionário. Foi estudar para o Porto e no liceu feminino sentiu-se, ela própria, marginalizada, tanto por colegas como por alguns professores, chegando a pensar deixar de estudar. Foi então que conheceu o jovem participante nas lutas académicas, António Lobão Vital, que ambicionava, também ele, um mundo diferente. Virgínia Moura encontrara o companheiro para toda a sua vida. Nessa altura não fazia ideia do que era um partido, apenas pressentia a possibilidade de fazer algo para modificar a situação existente à sua volta, as injustiças, a coação, o medo.
(2) O Movimento de Unidade Nacional Antifascista (MUNAF) foi fundado em 1943, [num momento de viragem na Segunda Guerra Mundial a favor dos aliados e contra o nazismo e o fascismo]. O Conselho Nacional era presidido pelo general Norton de Matos e nele estavam nele representados: o Partido Republicano Português, a União Socialista, o Partido Comunista Português, a Maçonaria, o grupo da Seara Nova, católicos, monárquicos e anarquistas. O comunicado de apresentação do movimento data de Janeiro de 1944. No ano de 1949, haveria dois actos eleitorais: presidenciais e legislativas (ambos já com o MUD ilegalizado). Durante três anos, apesar da repressão que se abateu sobre dirigentes e aderentes, foi resistindo mas acabou por ser proibido em Março de 1948. Todavia, é o MUD que lança, em Abril desse ano, a candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República. O general desistiu nas vésperas da eleição mas, no rescaldo, marcou- se a divisão política da oposição ao regime, agora agrupada em duas organizações: o Directório Democrato-Social (DDS), que englobava a oposição republicana liberal e cujos principais mentores eram Jaime Cortesão, António Sérgio e Mário de Azevedo Gomes, e o Movimento Nacional Democrático (MND), fundado por Ruy Luís Gomes, Virgínia Moura e Lobão Vital, em Março, inspirado pelo PCP.
(3) A ODAM que tinha como objectivo defender e divulgar os pontos de vista profissionais da arquitectura moderna, foi responsável por uma Exposição de Arquitectura realizada no Ateneu Comercial do Porto (1951) e mantinha contacto com Iniciativas Culturais Arte e Técnica (ICAT), grupo de arquitectos de Lisboa com objectivos semelhantes, que editou a revista Arquitectura e organizou as Exposições Gerais de Artes Plásticas (EGAP) em que vários arquitectos expuseram projectos de arquitetura a par das obras de artes plásticas. No seio da ICAT tiveram origem grande parte das teses apresentadas ao I Congresso Nacional de Arquitectura (1948).
(4) «Os monopolistas e latifundiários, quer por meio de mão clandestina – o terrorismo organizado – quer por meio da mão legalista – os partidos da direita – pretendem acabar de vez com as liberdades democráticas, com a reforma agrária, com as nacionalizações, com o controlo operário, com a auto-afirmação de Portugal como país livre e independente.»
(5) «O Arquitecto Lobão Vital, pela sua vida de luta contra o fascismo, pela seriedade com que sempre respeitou a sua opção (decidida ainda quando jovem) pelo Partido Comunista português, pelo seu espírito de sã camaradagem, pela firmeza do seu comportamento sempre que foi encarcerado pela polícia política do Estado Novo, pela alegria que sabia cultivar e transmitir mesmo nos momentos politicamente mais difíceis, pela lucidez de sua análise dos acontecimentos políticos ocorridos em Portugal e no Mundo, bem merecia que se realizasse aquilo que motivou a nossa reunião de agora, neste cemitério». – José Morgado na Homenagem.
(6) «E o amor, a activa cumplicidade existente entre Virgínia Moura e António Lobão Vital, ajudou a suportar tudo o resto.
A organizadora deste espólio, traça, igualmente, o retrato de Virgínia e Vital, os percursos da sua actividade cívica, longe das masmorras pidescas: as tertúlias nos cafés Primus ou na Brasileira, no Porto, que seriam “a mais pequena república socialista do mundo”, tertúlias de que fizeram parte personalidades como Artur Santos Silva (pai), Arménio Losa, António Macedo, Manuel Azevedo, Mário Cal Brandão, Papiniano Carlos; o nascimento da revista Sol Nascente, que teve a primeira redacção em casa do casal; a activa participação de ambos na candidatura à Presidência da República de Ruy Luís Gomes; a actividade cultural e de combate ao fascismo, o trabalho, a vida, os modos de cumprir, de enfrentar os dias sitiados». (Domingos Lobo- Ensaísta e crítico Literário, no Avante)
Biografia da autoria de Helena Pato
Fontes:
ANTT Registo Geral de Presos 384
(1951-1952), "Processo Arquitecto António Lobão Vital (processo político)", Fundação Mário Soares / Luiz Francisco Rebello, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_149085 (2020-7-20)

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