100 anos de militância a caminho do futuro

1921-2021

sexta-feira, 12 de março de 2021

Vozes do futuro

PCP em renovação geracional: "Inscrevi-me e muitos outros o farão"

 

Jovem militante do PCP, Joana Costa

Foto: PAULO SPRANGER / Global Imagens

João Vasconcelos e Sousa

06 Março 2021 

Quando Joana Costa nasceu, já a União Soviética não existia há mais de uma década. Há cinco meses, em outubro, esta jovem estudante do ensino profissional de teatro aderiu ao PCP. Seduzida pela luta dos comunistas nas escolas, diz ser a prova de que a renovação geracional do partido está assegurada.

Desagradada com as "condições das escolas, as turmas sobrelotadas e a falta de funcionários", Joana sentiu que o PCP era "o único partido que dava resposta" a esses problemas.

A frequentar o 12.º ano, viaja todos os dias do Seixal, onde mora, até à Secundária D. Pedro V, em Lisboa, num percurso que demora cerca de uma hora. "É a única secundária pública que tem o meu curso", lamenta.

Joana rejeita a ideia de que o PCP tenha dificuldade em captar jovens. "Assim como me inscrevi, muitos outros o farão". E, garante, essa mudança até já começa a ver-se: "durante as presidenciais tivemos montes de inscrições", afirma. De igual modo, recusa que o partido não se saiba adaptar aos novos tempos, dizendo ver uma estrutura que "inova" mas que, ao mesmo tempo, "nunca se esquece de onde veio nem para onde vai".

PCP reúne "os netos dos antifascistas que o fascismo não conseguiu matar"

A jovem militante serve-se de uma frase celebrizada no início da pandemia para dizer que, atualmente, é claro que "não estamos todos no mesmo barco". Tendo isso em conta, é à Esquerda que encontra "soluções para uma vida melhor e digna".

Quer "ter tempo para ter tempo" e poder desfrutá-lo também no lazer, na cultura e no desporto. E, "como mulher, estudante e jovem", é no PCP que encontra o espaço ideal para lutar contra "a discriminação, a exploração e a opressão".

Apesar de ser nova no PCP, Joana orgulha-se de pertencer a um partido transversal, que agrega desde os mais velhos "aos netos dos avós antifascistas que o fascismo não conseguiu matar". Sonha com um país em que se trabalhe para viver "ao invés de se viver para trabalhar"

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Guimarães: A Inês tem 19 anos, é militante do PCP e quer acabar com o capitalismo

Uma entrevista com uma comunista dos novos tempos

 

Inês Rodrigues tem 19 anos, quando nasceu o PCP já somava mais de 80. Não fez parte da história de luta contra o fascismo na clandestinidade que constitui o ADN do partido. Faz parte do futuro, num partido que assumiu como mote para a comemoração dos 100 anos: “temos mais projetos do que história”. É membro da direção nacional da Juventude Comunista Portuguesa (JCP), da comissão concelhia de Guimarães e da direção regional de Braga do PCP. Para esta estudante do segundo ano da Licenciatura em Geografia, na Universidade do Minho, o grande problema no mundo é o capitalismo e em Portugal elege os salários baixos como primeiro mal a atacar.

Há um passado político na família da Inês, gente ligada ao PCP ou a outro partido?

Efetivamente, sempre tive uma família muito interventiva do ponto de vista cívico. O meu pai é dirigente sindical, portanto, sempre houve uma grande força para andar atenta ao que se passa no mundo e no nosso país em particular e para intervirmos.

Como é que entrou para o PCP?

Foi através de uma ação que a JCP realizou na minha escola, na altura, a divulgar o Congresso. Conversei com os camaradas que estavam a distribuir documentos. Li o material que me deixaram e fui para casa pensar um pouco sobre aquilo. Cheguei à conclusão que queria ir ao Congresso para perceber um pouco melhor tudo aquilo e foi assim.

Que idade tinha nessa altura?

Quando me inscrevi na JCP tinha 16 anos.

Andava no 11.º ano, numa altura em que a maioria dos jovens não dedica muito tempo a pensar em política. Não é assim?

Da experiência que tenho na JCP, não noto isso. A nossa organização mais forte – porque nós organizamo-nos por setores – é mesmo o ensino secundário. Pela implantação que procuramos ter nas secundárias, pelo debate que levamos para as escolas. É comum jovens com 14, 15, 16 anos quererem tomar partido e organizar-se na JCP. Porque o que nós levamos às escolas são problemas muito concretos do ensino secundário, problemas da escola pública em geral e problemas de certas escolas em particular. Não sei se isto acontece em outras juventudes partidárias?

Mas, ao longo dos anos o PCP tem vindo a perder eleitorado, como se viu, agora, nas presidenciais. Quer dizer que esses jovens, depois de adultos, não votam no PCP?

Antes de mais, o Partido Comunista Português não vive de eleições, nem os momentos eleitorais são os principais momentos da vida deste partido. O partido nem vai a eleições enquanto PCP, concorre numa ampla unidade democrática das forças de esquerda deste país: com o Partido Ecologista Os Verdes, a Associação Intervenção Democrática e muitos outros independentes. Não faço leituras, a partir dos resultados eleitorais, sobre se o partido está a perder ou a ganhar força. O que nós vemos nas escolas, nos locais de trabalho, nas ruas e nas empresas, é que os comunistas estão onde estão os trabalhadores, onde estão aqueles que querem um mundo melhor. Muitas destas pessoas entendem que é preciso reforçar o partido, outros não. Mas aquilo que percebemos, até em reuniões internas, nos órgãos do partido, é que os resultados eleitorais não representam a força que o PCP tem junto das pessoas, nas ruas, nas escolas nas empresas. Posso revelar uma curiosidade: depois das eleições presidenciais, muitos foram os jovens que nos contataram por diversos meios, a assumirem que este é momento para tomarem posição. A organização regional de Braga fez mais de 15 recrutamentos, após as eleições.

O PCP é um partido muito conservador em termos de costumes, não lhe são conhecidas posições muito progressistas relativamente a família, homossexualidade, entre outros temas. Os jovens que chegam à JCP estão confortáveis com este posicionamento do partido?

Não podemos chamar conservador a um partido que quer modificar este sistema em que vivemos. Conservadores são aqueles que querem preservar este sistema, nós queremos transformar o mundo. O partido teve um papel importante na legalização da interrupção voluntária da gravidez, uma das grandes lutas que ainda agora, nas comemorações do centenário, foi realçada por diversas intervenções. A liberdade sexual, o PCP apoiou as uniões de facto entre casais do mesmo sexo. A igualdade plena é a igualdade social e económica, mas também a liberdade de podermos ser quem somos. Isto está no programa do PCP. 

O PCP faz 100 anos, contudo, há no partido um certo hábito para apagar nomes de gente que foi importante na organização. Carlos Brito, Zita Seabra, Pavel se recuarmos mais no tempo, só para citar alguns nomes de antigos responsáveis que foram apagados da história oficial. É assim ou não?

O partido passou 48 anos na clandestinidade e, por se ter mantido firme, foi a única alternativa que durante muito tempo existiu ao regime opressor e fascista. Muitos dos que se aproximaram do PCP nem se viam com comunistas, mas reconheciam ali a única forma de resistir, o caminho para a liberdade. Muitos foram aqueles que depois do 25 de abril, com o aparecimento de outros partidos, seguiram outros rumos. Nós nunca apagamos isso da nossa história, até porque temos como princípio não branquear o passado.

Mas não há nenhuma fotografia do Pavel nas sedes do PCP?

Não há fotografias de ninguém que não faça parte do projeto de futuro do PCP. Há poucas fotografias de indivíduos nos centros de trabalho, há muitas das grandes lutas do nosso povo.

O PCP apaga o indivíduo em favor do coletivo?

Não acho. Acho que quem vem ao PCP sente-se mesmo parte deste coletivo e sente responsabilidade individual de lutar na sua escola, na sua universidade, no seu local de trabalho. É uma entrega total a esta luta dos trabalhadores, pondo até de parte a sua vida pessoal, para cumprir com este compromisso.

Alguém que chegou tão recentemente a uma organização centenária, alguém que não tem as medalhas da luta contra o fascismo, é olhado como uma comunista de segunda?

Não. Todo o nosso património histórico é muito valorizado. Estamos muito gratos aos que lutaram contra o fascismo, não só nós comunistas, mas todo o povo português. Mas, o grande mote dos 100 anos é que temos mais projetos do que história.

Porque é que temos uma participação política tão baixa, em seu entender?

Reforço a ideia de que a participação democrática não se resume aos momentos eleitorais. Ainda assim, a abstenção é uma preocupação muito grande. Há uma série de problemas: as pessoas desconhecem as propostas e os partidos não se esforçam por dar a conhecer aquilo que é o seu trabalho. Com baixos salários, horários desregulados, sobrecarga horária é muito difícil as pessoas terem tempo, dinheiro e disponibilidade mental para a participação cívica. É isso que acontece quando se aprovam alterações ao pacote laboral que legitimam a precariedade. Precisamos de dar vidas dignas aos nossos jovens para depois eles poderem participar civicamente.

Mas o PCP tem refreado a sua veia contestatária para suportar o Governo? A contestação não se faz porque o PCP está alinhado com o Governo?

Não é verdade. O PCP não tem nenhum acordo com o Governo. O PCP, sempre que lhe é apresentado um documento, analisa, procura melhorar e depois decide a sua opção de voto. O pacote laboral teve o voto contra do PCP. Sempre que o PS precisa de aprovar estas normas vai buscar apoio ao PSD e ao que resta do CDS.

Se tivesse que eleger o grande problema do nosso tempo no mundo e um Portugal, qual, ou quais seriam?

Temos muitas preocupações. Pode ser um cliché, mas a nível mundial eu colocaria o capitalismo, o pai de todos os problemas: a guerra, a fome, a exploração do homem pelo homem, os problemas ambientais e as alterações climáticas. A nível nacional, colocaria como emergência nacional a elevação dos salários. O trabalho tem que ser valorizado para sairmos desta crise.

Quanto é que devia ser o salário mínimo nacional?

Os 850 euros, proposta do partido, proposta dos trabalhadores colocada pelos sindicatos.

Ainda haverá Partido Comunista Português daqui a 100 anos? O que é que gostaria que esse partido fosse?

A única certeza que tenho é que, daqui a 100 anos, outros aqui estarão para comemorar os 200 anos do Partido Comunista. Espero que o PCP daqui a 100 anos seja o que luta pelo progresso da humanidade, pelo fim da guerra, pelo fim da exploração do homem pelo homem.

 

 

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